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Dia Mundial do Orgulho Autista

 18 de junho é comemorado o Dia Mundial do Orgulho Autista.

“O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits na comunicação e na interação social, padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades”. (fonte: www.saude.pr.gov.br)

A data é uma iniciativa da organização americana Aspies for Freedom e passou a ser celebrada no Brasil em 2005. (Aspies pela Liberdade, em tradução livre; o termo "aspies" é uma abreviação de Asperger.

Vamos começar o texto já fazendo um alerta: autistas que tem conhecimento de história não aceitam ser chamados de Aspies ou Asperger.

O grande motivo é que o pediatra austríaco Hans Asperger, que deu nome à “Síndrome de Asperger” cooperou ativamente com o programa nazista de eutanásia. O doutor "legitimou publicamente as políticas de higiene racial, incluindo as esterilizações forçadas, e cooperou ativamente, em várias oportunidades, com o programa nazista de eutanásia de crianças". (fonte: Correio Braziliense)

Por muito tempo alguns termos como “autismo leve” e “síndrome de asperger” são usados para descrever a pessoa autista nível 1 ou 2 de suporte. Não existe autismo leve. Quando se usa esta expressão deve-se questionar: leve para quem?

Existir um dia mundial do orgulho autista é válido e necessário. Entretanto o que mais vemos em congressos, palestras e estudos são pessoas neurotípicas (não autistas) falando sobre autismo. Autistas são pouco ouvidos.

Hoje o que se vê é uma espécie de “mercadão do autismo”. Um abafador de ouvidos comum não é caro, porém se o vendedor colocar a palavra autismo o valor triplica. Terapias mirabolantes, falsas promessas a pais desesperados, promessa de cura para algo que nem é doença e acreditem: ódio por pessoas autistas adultas disseminados nas redes sociais. Por quem? Pais e mães de crianças autistas que acreditam que os adultos vão “roubar” o direito dos seus filhos. Quando o que acontece é justo o contrário. Os que têm coragem de se assumir autistas e lutar pela causa estão fazendo por todos. Nenhum adulto usa terapias ou direitos que são para crianças. Mas esta é uma parte triste da ignorância sobre o tema. Quando quem está vivendo o autismo não tem informações e acaba acreditando em fake News ou está tão revoltado que precisa destilar seu ódio em alguém... e acabam escolhendo justamente os que estão lutando pelo direito dos seus filhos.

Um dia tão bonito com um texto iniciado de maneira tão sombria. Pois é. Não é um mar de rosas ser autista. Poucas pessoas conhecem os cordões de identificação, poucas mesmo. O autismo é considerado uma deficiência não visível, o que quer dizer que “autismo não tem cara”. Diariamente autistas de todas as idades sofrem agressões físicas ou verbais apenas por utilizarem seus direitos.

Uma fila preferencial algumas vezes é um campo de guerra em que temos que decidir se vale a pena enfrentar ou não. Mas se existe a fila preferencial é porque há um motivo. Lojas possuem muitas informações, cores, barulhos, pessoas, cheiros, texturas... Tudo isso pode levar um autista a ter uma crise. Mas como não dá para ver a deficiência, há diversos relatos inclusive de agressões físicas para retirarem pessoas autistas ou com filhos autistas das filas. Agressões gratuitas, sem razão de ser... afinal o que vai mudar na vida daquela pessoa violenta o uso da fila preferencial? Vagas preferenciais de estacionamento seguem o mesmo padrão. Se a pessoa sai andando do carro deve ser agredida.

Por estes e outros tantos motivos que a maioria dos autistas opta por não usar o cordão de identificação. Medo de violência, medo de pessoas que acham que autismo é moda, frescura, falta de surra. Medo de pessoas mal intencionadas que acham que autistas são alvos fáceis para assaltos, golpes, etc.

Eu mesma na rua sem o meu marido não uso o cordão. Deixo ele guardado. Uso apenas em locais fechados onde me sinto mais segura. Preciso usar o cordão de identificação com 43 anos? Aí sim começaremos a falar sobre realmente o que deveria significar este dia mundial do orgulho autista.

Pais de crianças dentro do espectro usam o cordão de identificação não apenas para terem o direito seus e dos seus filhos preservados, mas também para que as pessoas vejam ao autismo. Não é birra que o filho está fazendo, estes pais precisam de acolhimento e não de julgamento.

E um adulto? Porque usar o cordão? Uso sempre meu cordão de identificação para mostrar o autismo, para que as pessoas me vejam como uma adulta que trabalha, tem família, filhos. Mas como? Você tem curso superior! Pós-graduação! Como pode ser autista? Já ouvi várias vezes perguntas assim à não são elogios.

Gostaria mesmo de viver em um planeta onde se pode mostrar o autismo sem medo. Ter orgulho de tudo o que conseguiu, lutou, alcançou mesmo vivendo em um mundo totalmente ignorante às nossas necessidades e repleto de estímulos e falas que nos fazem mal. Hoje tenho minha página @novela_da_minha_vida onde posto meu dia a dia e converso com muitas pessoas. Acho que esta é a parte mais importante da página, aquilo que recebo inbox. São pais, parentes, pessoas que acham que estão no espectro, autistas que não tem com quem falar e me chamam para pedir ajuda. Muitas pessoas adultas, com diagnóstico e são hostilizadas pela família porque são acusadas de estarem tentando chamar atenção.

Estas conversas são diárias. Pais que recebem o diagnóstico dos filhos e acham o meu perfil para me encherem de perguntas... mas e os médicos que diagnosticaram? Acreditem, poucos profissionais estão preparados para o acolhimento destas famílias. Normalmente são encaminhadas para terapias e fim. Mas e as tantas perguntas que ficam na cabeça dos pais? “Recebi o diagnóstico do meu filho de 5 anos como autista nível 1 de suporte, e agora? E se eu morrer?” Sou nível 2 de suporte... vamos conversar. E estas conversas duram muito tempo.

Então, ao invés de orgulho o que vem logo em seguida da palavra autismo é pavor. Há inclusive um grupo de mães que dizem que entraram em luto ao receber o diagnóstico. Alguns médicos e profissionais da área apoiam o uso do termo inclusive. Estas mães postam vídeos chorando porque estão sofrendo o luto do “filho idealizado”. Que tudo o que sonharam para seus filhos não irá acontecer. Para começar minha opinião é um pouco ríspida a este respeito e nada empática em relação a este tema. Um filho não deve “servir para realizar os sonhos de uma mãe”. Isto independe de ser neurodiverso ou neurotípico. Estes pais não pensam sequer por um segundo em como seu filho, quando crescer, vai se sentir ao ver as postagens e os grupos de luto que os pais entraram ao receberem o seu diagnóstico? Eu fui motivo de luto para os meus pais?

Sim, estes pais precisam de terapia e acolhimento de profissionais sérios que não compactuem com formação de grupos de pais enlutados. Isso afetará diretamente o desenvolvimento do filho inclusive evitando traumas com este tema. Filho idealizado? Sério mesmo?

Os filhos não devem carregar em seus ombros a realização dos sonhos de seus pais. Quando minhas filhas faziam ballet eu via muito isso. Mães que sonhavam e ter filha bailarina ou mesmo que queriam ser, mas não conseguiram. Vi crianças chorando fazendo uma atividade tão linda porque eram obrigadas. Triste.

Que em algum tempo o dia 18 de junho possa ser especial e que muitos autistas “saiam do armário”, se mostrem ao mundo. Que ser autista não seja motivo de medo constante. Por isso uso meu cordão, para dizer: estou aqui, eu existo, pesquisem a respeito, saibam quem eu sou.

Minha filha não usa o cordão e eu não posso julgar. Como vou julgar um adolescente não querer usar o cordão do autismo? Infelizmente usar o cordão é estar em risco iminente de sofrer bullying. Nos locais de saúde e escolas que espera-se o mínimo de entendimento do assunto... não há. O diretor da escola da minha filha não queria que eu participasse da reunião porque eu não entenderia sarcasmo ou algumas expressões faciais. O tema da reunião era justamente minha filha ter sido desrespeitada como autista por uma professora. Ela não usa o cordão, mas a escola teve acesso a todos os laudos. O diretor pode fazer isso? Não. Isso é um crime chamado capacitismo. Denunciei à ouvidoria, a professora se desculpou e o diretor escolheu me evitar.

O autismo é mais difícil de ser diagnosticado em mulheres, porque aprendemos desde muito cedo o “masking”, que nada mais é do que mascarar comportamentos atípicos, copiar o que a maioria está fazendo. Treinar sorrisos e expressões faciais. Tudo para ser aceito no padrão social vigente.

O que as pessoas não sabem é que o masking dói. Sim, autistas sentem dor física devido à sobrecarga sensorial, emocional. Movimentos repetitivos servem para nos autorregularmos, assim como outras coisas. Cada um é diferente do outro. Por isso além de um transtorno do neurodesenvolvimento é uma maneira diferente de sentir o mundo. E as sobrecargas acabam em crises. Meltdown, que é aquela crise explosiva que se vê muito em filmes. Shutdown, é um tipo de “desligamento”. Estas duas são as mais conhecidas.

Muitos autistas famosos geniais já foram expostos, principalmente na área de ciências exatas. E contrapondo isso há as pessoas que confundem autismo com deficiência intelectual. Existe autista com deficiência intelectual? Sim, mas como eu disse, cada autista é único.

Muitas pessoas acham que estão se informando sobre o tema assistindo séries e esquecem que para ter audiência é preciso romantizar a história. Mas é válido que cada dia mais o assunto esteja sendo discutido seja onde for.

Onde está o orgulho? Está em não desistir de espalhar a informação.

Não existe autismo leve. Asperger não é um termo aceito.

“Nem parece autista” à não é elogio

Não é falta de surra. Não é moda. Não é mimimi.  

É muito bonita pra ser autista. à não é elogio

O autismo traz diversas comorbidades. Um autista é diferente do outro.

Vacinas não causam autismo.

Excesso de telas não causam autismo.

Capacitismo é crime.

Não somos anjos azuis.

Eu sou autista. Apanhei muito para me comportar de um jeito “normal”. Não deu certo, óbvio. Vi pessoas se afastarem depois que comecei usar o cordão de identificação. Mas sim, continuarei usar. Tenho orgulho da minha história, tenho orgulho de ser uma autista que pode ser exemplo para outras pessoas no espectro.

Aguardo o dia em que mais adultos terão a coragem de usar o cordão de identificação. Porque abrir os caminhos para os adolescentes e crianças está em nossas mãos. Se sucumbirmos ao medo o tempo todo o orgulho autista continuará sendo apenas mais um dia para nos chamarem de “anjo azul” e iluminarem as  fachadas de prédios de- azul.





 

 

 

 

 

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